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segunda-feira, 20 de maio de 2024

Como estudar? (Parte II - a motivação)



Saudações estimados leitores e leitoras. 


Estudar é uma jornada pessoal que transcende e ultrapassa a simples aquisição de conhecimento, trata-se de um esforço contra o comum, um trabalho para redefinir a realidade dada por nós mesmos na condição atual. É um caminho que nos leva ao crescimento intelectual e pessoal, moldando não apenas o que sabemos, mas quem somos.


Desde tenra idade, a curiosidade é uma faísca que acende o desejo de aprender mais, demonstrando principalmente a nossa limitação momentânea e revelando as nossas potencialidades. Ela, a curiosidade, nos motiva a questionar o mundo ao nosso redor e buscar respostas que satisfaçam nossa sede, talvez natural, de conhecimento. Mas, isto é óbvio, só possui curiosidade aquele que compreende que não está pronto, acabado e perfeito (no sentido estrito de feito por inteiro), demanda um grau indeterminado, de dúvida e de consciência de si.


Muitos estudam movidos pela visão de alcançar um futuro promissor, de sucesso ou de superação das dificuldades atuais. A educação é vista como um “investimento” essencial para alcançar objetivos profissionais e realizar sonhos. Ou seja, para muitas pessoas o estudo é visto como um grau de esforço, algumas vezes de sacrifício, para alcançar objetivos maiores e isto motiva para a realização das atividades dia após dia.


Para alguns, o estudo é motivado pelo prazer de enfrentar e superar desafios intelectuais. Resolver problemas complexos e dominar assuntos difíceis traz uma sensação de conquista, de gosto pela sabedoria, de vaidade por conquistar níveis cognitivos que não são comuns.


Há também aqueles que são motivados pelo desejo de causar impacto positivo na sociedade, provocando benefícios para a vida coletiva e progresso do bem comum. Através dos estudos, estas pessoas buscam as ferramentas necessárias para contribuir e fazer a diferença significativa no mundo.


O estudo é, de fato, um meio de autoconhecimento, conhecimento e desenvolvimento pessoal. Aprendendo novos conceitos e habilidades, expandimos nossa compreensão sobre nós mesmos e sobre a vida, condições que causam benefícios pessoais e coletivos e que só podem ser compreendidos pelos sujeitos na medida que tomam consciência de seus feitos.


Em muitas carreiras, não podemos ignorar, a atualização constante é uma necessidade vital para a manutenção de seu cargo ou para progredir na instituição do labor. A motivação para estudar, neste caso, vem da necessidade de manter-se relevante e competente em um mercado de trabalho em constante evolução.


Para outros, ainda, estudar é uma forma de honrar o legado de gerações passadas ou de ser um exemplo para as futuras. É uma maneira de perpetuar o valor da educação e inspirar outros a seguir esse caminho, valorizando substancialmente a nossa condição enquanto espécie humana.


Diversos estudos científicos mostram que aprender coisas novas pode trazer benefícios cognitivos, como melhor memória e raciocínio, causando como consequência a ampliação da qualidade de vida e da saúde mental e física. Essa é uma motivação importante, especialmente à medida que compreendemos o tempo em que envelhecemos.


Em suma, as motivações para estudar são diversas e profundamente pessoais, mas fato é que não existe estudo significativo se o sujeito da ação não compreende o que está impulsionando a sua atividade, aquilo que o motiva. Seja por curiosidade, ambição, desafio ou responsabilidade social, estudar é um ato de enriquecimento que nos transforma e prepara para o futuro, por isso, cada um de nós cedo ou tarde precisa lidar seriamente com a pergunta: o que motiva o meu esforço para o estudo?


E você, estimado (a) leitor (a), o que lhe motiva a estudar?


Atenciosamente/Respeitosamente.

Professor Ricardo de Jesus Lopes

domingo, 31 de março de 2024

Como estudar? (Parte I - "Preparando o terreno")


Saudações estimados (as) leitores.

A busca pelo conhecimento é uma jornada contínua e a forma como estudamos determina até onde as nossas capacidades serão desenvolvidas. Com a variedade de métodos de estudo disponíveis e difundidos em diferentes metodologias escolares e não escolares, é essencial encontrar aqueles instrumentos que lidem melhor com nossas necessidades individuais e objetivos de aprendizado que pretendemos.

Mesmo com tantos materiais e referências disponíveis, parece que as pessoas, de modo geral, possuem muita dificuldade em compreender quais são as ações ou atividades que devem ser realizadas sob o nome de "estudar". Há quem creia que estudar é ler. Há quem pensa que estudar é realizar anotações de aulas, ou do objeto que está estudando. Para tentar elucidar melhor o que pode e deve ser considerado "estudo", neste momento, partimos de algumas proposições básicas para em seguida aprofundar, propondo ganhos de qualidade e complexidade.

Em primeiro lugar, parece importante destacar que existe uma dimensão do que chamamos de estudo que é absolutamente solitária e individual. O estudo individual oferece a liberdade de explorar tópicos no próprio ritmo, permitindo uma espécie de personalização que pode ser crucial para a compreensão profunda de algum determinado tema. Por exemplo, um estudante de música pode passar horas praticando um instrumento, enquanto um aspirante a programador pode dedicar tempo para resolver problemas de codificação complexos. Ou um cirurgião dedica longos tempos treinando a precisão de suas mãos para nao cometer erros, ou o professor que passa horas descobrindo qual o melhor modo de ensinar determinado grupo. A costureira que dedica muito treinamento para confeccionar perfeitamente, enfim, para cada labor se exige que domine as técnicas apropriadas e, com o estudo não é diferente. Pessoas com dificuldade em alguma área do conhecimento podem levar mais tempo para conseguir entender o melhor jeito de estudar certas matérias e terão mais conforto e segurança nas áreas que possuem facilidade. Algumas pessoas resolverão certas aprendizagens de modo rápido e outras de modo mais lento, legando ao estudo individual a possibilidade que equilibra e refina o esforço dedicado. É preciso que cada um de nós saiba como aprende melhor cada objeto de estudo, reconhecendo suas virtudes e vícios para superar cada etapa com sucesso. Essa abordagem individual permite ajustes finos e específicos nas técnicas de estudo, tornando o aprendizado mais eficiente e eficaz. Existem tantas possibilidades quanto mentes humanas, por isso, caberão muitas complementações sempre que falarmos de maneiras de estudo individual.

Por outro lado, existe a dimensão do estudo em grupo que traz a vantagem da colaboração que somento o coletivo pode proporcionar. Discutir ideias com outros pode expor perspectivas diferentes e facilitar a resolução de problemas. Em disciplinas onde a interpretação é chave, estudar em grupo pode enriquecer o entendimento através do debate e da troca de ideias. Ou seja, quando se trata de conseguir compreender teses e antíteses que nos darão a visão geral de um fenômeno, o estudo coletivo, em grupos, aparece como método mais funcional e que deve ser prioridade para dar a devida dimensão da complexidade dos objetos de estudo.

A tecnologia também pode desempenhar um papel fundamental nos estudos modernos. Ferramentas como aplicativos de flashcards, plataformas de cursos online e fóruns de discussão podem complementar métodos tradicionais, oferecendo novas maneiras de engajar com o material de estudo. A gamificação, por exemplo, pode transformar o aprendizado de uma língua estrangeira em uma experiência divertida e interativa. Mas, também não podemos esquecer que caderno, lápis, borracha, canetas, livros e recursos mais "antigos" também são muito úteis e são verdadeiramente a base dos processos de aprendizagem e não devem ser abandonados em nenhuma hipótese (um dos trabalhos desta série de textos será exclusivamente para ressaltar a importância de certos métodos tradicionais de estudo).

Por fim, nesta ocasião, é preciso reconhecer que não existe uma resposta única para a pergunta “como devemos estudar?”. Cada indivíduo deve considerar suas preferências pessoais, objetivos e contexto para moldar sua abordagem de estudo. O importante é manter a mente aberta para diferentes métodos e estar disposto a adaptar-se conforme necessário para alcançar o sucesso acadêmico e pessoal. Desta forma, acredito que tenhamos conseguido "preparar o terreno" para poder aprofundar o tema que é tão importante para as pessoas que buscam desenvolver suas capacidades sempre, das crianças até a plena maturidade.


Espero que você tenha gostado deste material e caso possa compartilhe, comente ou critique esta publicação para que possamos continuar o desenvolvimento e melhorar sempre.

Atenciosamente.
Professor Ricardo de Jesus Lopes

terça-feira, 4 de abril de 2023

Uma introdução à Filosofia: Filosofias e filosofares (Parte I)



Saudações fraternas, é um prazer inenarrável ter sua companhia neste texto.


É impressionante como existem palavras que conseguem ganhar notoriedade dada a sua diversidade semântica, no entanto, existem algumas poucas palavras que além de sua multiplicidade semântica traz consigo uma variedade etimológica, epistêmica, ética, política, estética etc., uma delas é “filosofia”.


Quem não adoraria que todas as perguntas que podemos levantar tivesse respostas simples e objetivas? Não é o caso da situação que trabalharemos aqui e, sem dúvida, se as respostas do mundo, da existência, do pensamento e dos humanos fossem objetivas nós ao longo dos milhares de anos da existência de nossa espécie teríamos dado passos maiores do que os que nos trouxeram até aqui.


Não é novidade, nem original, o tema proposto nos parágrafos que seguirão, mas, dadas as condições de nossa formação é preciso estimular que a tradição filosófica seja valorizada, conhecida, criticada, trabalhada, em suma, reconhecida dentro da dinâmica do conhecimento proporcionado pela inteligência de nosso povo.


Muitos tiveram a audácia de tentar definir o que é a filosofia e o filosofar, tendo por objetivo esclarecer e revelar a importância do pensamento filosófico, mas, precisamos reconhecer que quanto mais se tentou explicar maior foi a diversidade de assuntos, sentidos, pensamentos, reflexões que precisaram ser aglutinadas no termo “filosofia”. 


Para tentar acrescentar aos grandes que já se desafiaram neste desafio, proporemos um trabalho que visa juntar as tentativas mais notórias e as mais abrangentes para que o público que inicia os estudos em sentido formal ou informal possa se amparar. Sobre o ombro dos grandes procuraremos, enquanto pequenos, nos apoiar para alcançar com os olhos de nosso espírito um horizonte mais longínquo e fecundo.


Para iniciar a nossa investigação gostaria de destacar uma consideração bastante fecunda proposta pelo Professor Sílvio Gallo (1963-): 


“A filosofia já foi definida de várias maneiras. A palavra, de origem grega, é composta de phílos, que designa o ‘amigo, amante’; e sophía, que significa ‘sabedoria’. O significado de filosofia, portanto, é amor ou amizade pela sabedoria. Se a filosofia é um amor pela sabedoria, isso quer dizer que ela não é a própria sabedoria, e sim uma relação com o saber e que implica um movimento de construção e de busca da sabedoria (GALLO, 2016, p.12)”.


O Professor Gallo (2016) ao mesmo tempo que apresenta o sentido etimológico do termo filosofia, derivação semântica aglutinada de dois termos gregos antigos que consolidam a ideia de “amor pela sabedoria”, traz o movimento epistemológico que o termo procurou abarcar desde seu surgimento formal na língua, ou seja, o termo foi cunhado com a intenção de revelar que a filosofia não é a posse da sabedoria ou a própria sabedoria, mas, na verdade, é uma relação que ocorre quando um sujeito busca a sabedoria, ou, ainda, é um movimento de construção dos saberes.


“Amar a sabedoria”, talvez assim, neste sentido de ação, podemos compreender ao que se dedica aquele que se dedica ao filosofar. Assim trazemos a dimensão de um agir, de um esforço, de um trabalho que visa alcançar um determinado objetivo e, cá entre nós, não é qualquer objetivo, é a sabedoria. E, sabedoria, pode ser entendida tanto quanto um saber extenso, qualificado e profundo, como também pode ser entendido como a capacidade de utilizar os saberes para o bem, para o bem viver e para o bem coletivo.


Desde a origem do termo, a palavra filosofia já quis demonstrar esta sua capacidade especial, abrangente e profunda, e uma forma de ação que visava se diferenciar das demais formas de conhecimento. Segundo a Professora Marilena Chaui (1941-):


“Atribui-se ao filósofo grego Pitágoras de Samos (que viveu no século V antes de Cristo) a invenção da palavra filosofia. Pitágoras teria afirmado que a sabedoria plena e completa pertence aos deuses, mas que os homens podem desejá-la ou amá-la, tornando-se filósofos (CHAUI, 2000, p. 19)”.


Nesta especialidade que o termo filosofia já buscava mesmo em sua origem, a ideia central era diferenciar dos demais discursos vigentes que os humanos utilizavam para explicar o funcionamento do universo, ou seja, podemos dizer que é uma saída da humanidade das explicações cosmogônicas (universo ordenado pelos astros, deuses ou forças superiores) para uma explicação cosmológica (universo ordenado pela razão).


Isto não quer dizer que os astros, deuses, ou forças superiores não existam, mas, como o próprio Pitágoras de Samos teria dito, esta ordem do conhecimento não pode ser acessível para nós mortais, humanos, terrenos, racionais. Para nós, seres limitados de tantas formas, talvez jamais tenha sido possível e jamais será possível alcançar a plena sabedoria, mas, pela capacidade pensativa, lógica, racional, podemos amá-la e procurá-la.


Já que não podemos alcançar, ou é muito difícil alcançar a sabedoria, o que é esta procura? Do que estamos falando quando propomos filosofar? A própria professor Marilena Chaui resgata a forma como Pitágoras de Samos teria explicado, diz:


“Dizia Pitágoras que três tipos de pessoas compareciam aos jogos olímpicos (a festa mais importante da Grécia): as que iam para comerciar durante os jogos, ali estando apenas para servir aos seus próprios interesses e sem preocupação com as disputas e os torneios; as que iam para competir, isto é, os atletas e artistas (pois, durante os jogos também havia competições artísticas: dança, poesia, música, teatro); e as que iam para contemplar os jogos e torneios, para avaliar o desempenho e julgar o valor dos que ali se apresentavam. Esse terceiro tipo de pessoa, dizia Pitágoras, é como o filósofo (CHAUI, 2000, p. 19)”.


O exemplo pitagórico destaca a qualidade das experiências possíveis aos humanos, existem aqueles cuja finalidade é tentar manipular a ordem da realidade para produzir benefícios individuais, tal como riqueza ou vantagens, ou aqueles que visam demonstrar maior compreensão sobre o melhor manusear das realidades, ou os que diante da realidade procuram reconhecê-la, contemplá-la e avaliar/julgar os modos pelos quais funciona. Ou seja, existem os que se dedicam exclusivamente de forma prática-funcional com a realidade e existe o filósofo que se coloca diante da realidade para contemplar a verdade, procurar sua razão de funcionamento e entender como estar diante dela.


Os que souberem com maior influência determinar as realidades para seu benefício próprio agregarão riquezas, enquanto os que não forem hábeis nisto, menor riqueza, os que souberem manipular de modo mais a eficaz a realidade para ser o melhor em algo serão reconhecidos como “campeões”, enquanto os menos hábeis serão os derrotados. Por fim, existem os que se dedicam a comtemplar e compreender a existência, estes serão os filósofos, os que não forem hábeis filósofos recaem nas duas formas anteriores de existência.


Portanto, segundo este sentido pitagórico, o papel do filósofo não é buscar riquezas ou consagração, mas sim colocar-se diante do universo de acordo com sua posição, compreendendo sua limitação, contemplando a verdade e buscando as razões pelas quais ela opera.


Evidentemente, esta explicação proposta ainda na antiguidade traz em si marcas profundas de sua época e a filosofia, tal como a concebemos hoje, transformou-se determinantemente conforme cada pensador e pensadora estabeleceu sentidos tradicionais, conservações e transformações, por isso, não podemos limitar o pensamento filosófico simples como busca pela sabedoria e não podemos limitar a posição do filosofar como exclusivamente contemplatória. Em suma, não podemos nos prender exclusivamente na etimologia para compreender o que é a filosofia.


Referências desta parte do estudo:

CHAUI, M. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 2000.

GALLO, S. Filosofia: Experiência do pensamento. São Paulo: Scipione, 2016.


[Gostou deste texto ou tem alguma crítica? Comente, compartilhe e ajude  este trabalho autônomo e feito com muito carinho a se desenvolver. Juntos podemos chegar mais longe!]


Atenciosamente.
Professor Ricardo de Jesus Lopes

sábado, 19 de novembro de 2022

Uma abordagem geral da História de Roma na Antiguidade



Saudações fraternas.


A tarefa de construir uma abordagem geral da História de Roma na Antiguidade é complexa, exige seleção e um encadeamento dos indícios que permita a legitimidade e a significação aceitável para uma interpretação acadêmica. Sendo assim, complexo, cabe na abertura precaver que a abordagem que segue é uma seleção daquilo que pode ser considerado consensual na historiografia, é um recorte bastante limitado para promover o início de uma investigação.


“[...] a história de Roma não foi a história de apenas uma cidade, mas de um vasto território conquistado por esta cidade-Estado inicialmente constituída pela Península Itálica e, mais tarde, estendendo-se a uma faixa de terras que ia desde a chamada Britanha até o Rio Eufrates, passando por terras do Norte da África que vieram a fazer parte do Império Romano” (SILVA, 2013, p.35).

    
O surgimento de Roma remonta ao século VIII a.C. na região conhecida como Lácio e de alguma forma representou a unificação de diferentes povos que ali habitavam, especialmente de grupos latinos, sabinos e etruscos. Os últimos, os etruscos, através de seus chefes teriam exercido protagonismo na unificação, criando estruturas de organização que preservavam a realização da vida na região (PELLEGRINI,2016, p.144).
    

Segundo o historiador francês Pierre Grimal (1912-1996) os mitos e lendas dos primeiros tempos romanos são importantes porque explicam realidades através de processos formados de modo inconsciente, como mecanismo de busca por uma explicação do real através de atitudes determinantes para um dado povo (SILVA, 2013,p.37). Sendo assim, a lenda de formação de Roma pode nos oferecer indícios para compreender o momento.


“Uma dessas lendas remete-nos à figura de Enéias, príncipe troiano cujo destino divino seria tornar-se rei do norte da Península Itálica. Segundo essa lenda, Enéias, filho do rei troiano Anquises e da deusa Vênus, foge de Tróia após a guerra para fundar uma cidade, Alba Longa. Os descendentes de Enéias, os gêmeos Rômulo e Remo, fundaram Roma e, após Rômulo matar Remo, tem início a monarquia romana” (SILVA, 2013, p.14).
    

Essas lendas demonstram que durante a formação de Roma está presente a caracterização miscigenada que iria compor esta cidade-Estado, além de ressaltar um laço direto com os gregos, o que demonstra uma certa admiração destes povos, que seriam a raiz fundante de seu próprio povo (SILVA, 2013, pp.14-15).
    

Consolidada as origens de Roma, podemos dividir, para fins explicativos, os processos históricos de Roma em fases: 1ª Roma Monárquica: da fundação da cidade até 509 a.C.; 2ª Roma Republicana: do período de 509 a.C. até 27 a.C.; 3ª Roma Imperial: de 27 a.C. até 476 d.C.
    

A primeira fase, da Roma Monárquica, a cidade-Estado foi governada pelos sete reis lendários. Estes reis representam a fundação da cidade (rei Rômulo), a organização religiosa da cidade (rei Numa), a organização militar da cidade (rei Túlo Hostílo), os cuidados defensivos da cidade, ampliação dos limites da cidade (rei Anco Márcio), construções de edifícios para a cidade (rei Tarquínio, o Antigo), representação do povo no governo da cidade (um rei que supostamente vem de origens simples, o rei Sérvio Túlio) e um conflito entre o rei e as família patrícias, poderosas em vários sentidos e almejavam o reconhecimento político (rei Tarquínio, o Soberbo) (SILVA, 2013, pp.47-48).
    

A segunda fase, da Roma Republicana, os patrícios, uma elite romana, assume o poder político de governança e instaura uma organização de Estado chamada de republicana. A administração da cidade tinha como principal órgão o Senado, que era composto por esta elite patrícia e negociava os interesses para manter o seu poder. O aumento da dependência da plebe e dos militares por parte da elite, este sistema passa a corroer e sua manutenção se torna insustentável, encerrando esta fase (PELLEGRINI, 2016, p.146-150).
    

A terceira fase, da Roma Imperial, “O estabelecimento do Império foi a solução política encontrada para assegurar a estabilidade do poder e anular os conflitos existentes entre as várias facções” (FLORENZANO, 1987, IN: SILVA, 2013, p. 82). 


Em suma, com o fim de organizar os muitos interesses presentes na cidade, estabeleceu-se a centralização do poder em modelos de príncipes virtuosos e esclarecidos, capazes de utilizar estas habilidades na manutenção da unidade da cidade. Este modelo vigora até a desestruturação do império ocidental e o fim deste modelo vigente.


Referências Bibliográficas:
- PELLEGRINI, M.C. #Contato história, 1º ano. 1.ed. São Paulo: Quinteto Editorial, 2016.
- SILVA, S.C. História Antiga II. Batatais,SP: Clarentiano, 2013.

sexta-feira, 22 de maio de 2020

Politicamente correto ou politicamente incorreto? (Parte I)

Saudações nobres leitores (as).

Há tempos observamos na esfera comum queixas ou defesas do politicamente correto. Vemos algumas pessoas que se vangloriam por "serem politicamente incorretas", vemos gente dizendo que "o politicamente correto acabou com a possibilidade de dizer a verdade".

Infelizmente a minha ignorância dificulta o entendimento do que os discursos a favor ou contra o politicamente correto. Aparentemente, em minha modesta visão de mundo, é demasiado óbvio que o politicamente correto é uma decisão boa para a realização da vida coletiva. Afinal, por que alguém escolheria ser politicamente incorreto? Por que alguém deliberadamente escolheria fazer errado? Talvez eu não compreenda bem a expressão e, justamente por isso, decidi investigar a respeito.

Em primeiro lugar, para entender essa questão, parece que o problema do "politicamente correto" ou do "politicamente incorreto" estão no âmbito da semântica, porque diferentes concepções epistemológicas produzem sentidos diferentes para as expressões. Para tentar elucidar, vamos procurar uma conceitual aos termos.

Luiza Bandeira (2018) escreveu um pequeno artigo para o portal "Nexo Jornal" onde investiga as origens e o uso histórico das expressões que geram inúmeras controvérsias no debate público. Segundo esta autora as origens da expressão não são consensuais dentre os pesquisadores (as), ainda, mas, o primeiro registro encontrado até então remonta a 1793, quando o termo foi utilizado do modo mais literal possível, ou seja, o "politicamente correto" expressava o modo certo de fazer política. Este registro está em um documento da Suprema Corte Americana, instituição jurídica dos Estados Unidos da América. O uso da expressão era para assegurar o bem dizer, tal como "deve-se dizer em um brinde: 'às pessoas dos Estados Unidos' ao invés de 'aos Estados Unidos'".

O uso demonstrado pela Suprema Corte no século XVIII revela que para aqueles magistrados deveria colocar as pessoas como centro da constituição do Estado e não o Estado como instituição mecânica. Para legitimar estas ideias que representavam com maior fidelidade as decisões da instituição, usou-se a expressão "politicamente correto" como a referência que permitia desenvolver de modo correto a vida política.

Outra possível origem da expressão "politicamente correto" seria o regime stalinista da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas aproximadamente nos anos de 1930. Segundo está possibilidade o termo deveria designar o sentido de que "os interesses do partido estavam acima da própria realidade", ou seja, uma afirmação que poderia ser factualmente correto poderia ser incorreta politicamente e, em nome da manutenção do regime, deveriam se submeter ao "politicamente correto".

A terceira possível origem da expressão "politicamente correto" é que esta foi disseminada nos Estados Unidos da América nas décadas de 1960 e 1970 com o uso mais próximo do que parece querer ser usual hoje. A expressão teria sido "emprestada" de um discurso do líder chinês Mao Tsé-Tung, onde as pessoas da esquerda estadunidense utilizavam de modo "jocoso", revelando aquilo que era dito como "politicamente correto" como algo dogmático, ou que aparecia como uma espécie de certa absoluta que era de algum modo duvidosa.

As referências de Luiza Bandeira (2018) são reconhecidas por sua credibilidade, tal como a Harvard Political Reviw, o professor Angelo M. Codevilla da Universidade de Boston e a professora Ruth Perry do MIT. O artigo é curto, mas vale muito a leitura. Aqui apenas destaquei algumas ideias que parecem úteis para o meu empreendimento de compreender os diferentes usos do termo "politicamente correto".

Com base nas possíveis três origens é possível notar que: a primeira prioriza o uso no sentido literal de "politicamente correto", ou como expressão daquilo que é o correto para o desenvolvimento das relações políticas; a segunda, cunhada no regime stalinista soviético o "politicamente correto" aparece como uma espécie de meta-realidade, ou seja, o objetivo maior da esfera política é garantir a unidade do Estado, mesmo que isso possa ferir a realidade factual; a terceira, o termo serve como ironia para aquilo que é apresentado de forma dogmática, ou seja, como expressão irônica daquilo que se apresenta como verdade, mas que é duvidoso.

Até aqui é possível concluir que existem ao menos três variações semânticas para o emprego da expressão "politicamente correto", no entanto, as três formas são distintas, como já foi apresentado, e, até, antagônica, caso seja possível inferir que em um extremo reside a literalidade e no outro a falsidade do dito. Isto não parece resolver o problema, afinal, ser ou não ser "politicamente correto"?

Talvez seja útil adicionar mais alguns elementos antes de tirar conclusões. A professora Moira Weigel, pesquisadora associada da Universidade de Harvard, dedicou-se  a pesquisa desta expressão e concluiu que "o discurso contra o "politicamente correto" é uma retórica que inviabiliza o debate democrático". Vamos explorar como ela chegou a esta conclusão para percorrer as nossas próprias ideias e concordar ou discordar dela.

Segundo Weigel (2018) não é tão óbvia a tentativa de traçar uma história do uso da expressão "politicamente correto", uma vez que as palavras isoladamente são recorrentes, como separar o uso isolado de cada palavra da expressão? No entanto, ela percebeu, no decorrer de suas pesquisas, que buscar a história do "politicamente correto" é ao mesmo tempo desbravar a história do que é o "politicamente incorreto". Ela trabalha com a possibilidade de ambas as expressões terem origem nos Estados Unidos da América, a sua usualidade passou a ser pouco recorrente entre os membros da New left (movimento de esquerda do período da década de 1930) e vai adquirir um uso mais recorrente nas décadas de 1960 e 1970 e passa a ser usado no sentido mais próximo do que temos hoje a partir da década de 1990.

A partir do momento que a expressão "politicamente correto" passou a ser utilizada em sentido de chacota ou de comentário jocoso, passou-se a utilizar a expressão para denunciar os procedimentos discursivos, morais e políticos que estariam supostamente inviabilizando o exercício da liberdade humana. A força da expressão, entretanto, surge com a apropriação da "direita" estadunidense, que utilizam a expressão para atacar o "politicamente correto".

Weigel (2018) chega a afirmar que a narrativa contra o "politicamente correto" foi apropriado por movimentos de "direita" para deslegitimar os discursos das Universidades e da Imprensa Tradicional dos Estados Unidos da América. Ou seja, aquilo que em primeiro momento servia para criar desconfiança nos oponentes políticos passou a ser estendido a todos os discursos que poderiam se opor a suas posições, isto ocorreu especialmente entre as décadas de 1980 e 1990.

Quando questionada se estas críticas realizadas pela "direita" norte-americana estavam relacionadas a mudanças ou transformações sociais e demográficas, a pesquisadora afirma: "Sim, certamente. Havia mudanças sociais ocorrendo nas universidades. As mulheres estavam entrando, havia mais negros nas universidades. Em 1965 há uma reforma migratória que traz pessoas do leste asiático para os Estados Unidos e, no início dos anos 1990, chegam cada vez mais imigrantes latino-americanos. Em certo modo, a narrativa do politicamente correto é uma reação a uma série de mudanças sociais e demográficas que estão acontecendo. Mas essa narrativa passa uma ideia de que existe um pequeno grupo, formado por professores e pela própria imprensa, que está forçando essas mudanças de cima para baixo, às custas das 'pessoas comuns'. Num momento em que muitos norte-americanos brancos estão perdendo os seus empregos em razão da desindustrialização, a história do politicamente correto - sobre um bando de intelectuais judeus ou não brancos tomando o controle das universidades e da imprensa e fazendo com que as 'pessoas comuns' se sintam desamparadas ou mesmo envergonhadas - ressoa. É uma narrativa que a direita usa para manter o poder, para a classe trabalhadora embarcar numa aliança com a agenda corporativa do big business em meio às mudanças demográficas e culturais" (WEIGEL, 2018).

O interessante da resposta de Weigel (2018) é que existe uma relação, coincidência ou não, entre o empoderamento das tradicionalmente chamadas "minorias" pelas pessoas comuns com um discurso que busca acabar com a legitimidade deste discurso através de uma retórica que acusa a "minoria" de ter o domínio de um determinado contexto, sendo ela a opressora do "cidadão comum". Os ataques contra o "politicamente correto" ganham força quando aqueles que estavam fora do exercício decisório da sociedade assumem papéis inéditos na sociedade e fazem supostamente uso deste poder para legitimar a si mesmos.

A pesquisadora é extremamente pontual para encontrar evidências históricas e sociais que determinam o uso pejorativo do "politicamente correto", isto demonstra que a expressão não é neutra, ou pautada por literalidade, mas, é sim, um instrumento ideológico, um determinante do "jogo político", ou, ainda, um véu que dificulta o entendimento pleno da realidade por aqueles que fazem parte das "pessoas comuns".

Em termos práticos, a pesquisadora revela inúmeros casos de como o ataque ao "politicamente correto" ocorre na forma de discursos misógenos, racistas, xenófobos, etc. Não me parece necessário reproduzir tais casos, mas eles podem ser encontrados na referência da pesquisa.

Dado os usos práticos e políticos, da expressão "politicamente correto" por uma específica categoria política, a direita tradicional e a extrema direita, a expressão passou a transmitir para as pessoas comuns que a afirmação das "verdades" deveriam ser manifestas sem se importar com as consequências, porque supostamente representam a verdade. Talvez isso explique a grande adesão ao discurso crítico do "politicamente correto".

Em outras palavras, os críticos do "politicamente correto" utilizam a ideia de que o discurso que foi conquistado historicamente pelas minorias são ilusórios, porque inviabilizam a manifestação da "verdade", mas não coloca em cheque o próprio discurso proferido como "politicamente incorreto". Podemos compreender estes usos como ferramentas retóricas, ou seja, em nome do desafio que parece corajoso contra o "politicamente correto" se sustenta a validade do discurso, mas isso é o bastante?

Talvez para testar a validade deste recurso retórico seja útil fazer uso de um exemplo da esfera epistemológica e posteriormente um exemplo do campo social.

De uma perspectiva científica-acadêmica, podemos dizer de modo geral sem perder rigor, que todo conhecimento afirmado se legitima sobre princípios que são consensuais e que se previne contra a arbitrariedade através da possibilidade da falseabilidade, ou seja, dadas condições mais adequadas de entendimento sobre um fenômeno, um paradigma novo que é capaz de explicá-lo pode refutar a afirmação anterior que tem sua validade superada pelo novo. Podemos pensar na diferença entre a física newtoniana e a física relativa (proposta a partir da validação do pensamento de Einstein), que talvez seja de conhecimento de todos. Os pesquisadores (as) da física utilizam o sistema newtoniano até o seu limite, estabelecendo até que ponto ele é capaz de responder satisfatoriamente aos problemas dos fenômenos da realidade, a partir do momento que este paradigma de referência não dá conta dos problemas, procuram novas bases para sustentar os conhecimentos e, assim, Einstein buscou consolidar novas bases para o conhecimento físico, bases que permitem trabalhar e responder com maior validade aos problemas investigados. Caso você queira compreender melhor como isso se dá, basta estudar a História da Ciência, ali são demonstrados como sistemas de pensamento explicativos de fenômenos são formados, reformados e como constroem validades e invalidades.

Saindo da temática da epistemologia e entrando novamente no âmbito político-moral, podemos elencar como exemplo afirmações que deveriam soar estranhas, mas, inversamente, tem ganhado força nos discursos. Vemos personalidades que alcançam grandes públicos e até que representam em funções políticas afirmar coisas como: "sou preconceituoso, com muito orgulho", "todo mundo sabe que as mulheres são loucas", "pessoas nascidas em determinado lugar são depravadas, são violadoras dos bons costumes, por isso não queremos proximidade com elas", "tal população é terrorista", "o filho virá gay porque faltou porrada", dentre tantas outras da mesma ordem.

Atitudes preconceituosas são dignas de orgulho? As mulheres são loucas? Todas as pessoas de uma dada origem são depravas? O que estamos chamando de depravado? Pessoas de culturas diferentes podem ser chamadas de portadoras de costumes ruins? É possível toda uma nação ser terrorista? Porque os que agem com violência contra nós são chamados de terroristas e quando nós exercemos violência sobre os outros nos consideramos heróis? A quantidade de "porrada" que alguém toma é o que determina a sua sexualidade e o seu gênero?

Diferente das questões epistemológicas, que podem ser observadas no desenvolvimento da ciência e do pensamento acadêmico, já exemplificados à luz das ciências físicas, as afirmações que se dizem "politicamente incorretas" para poder expressar a verdade não chegam minimamente perto de responder perguntas simples, como as que foram propostas a pouco. Ou seja, o que legitima na esfera discursiva afirmações do "politicamente incorreto" é apenas uma convenção anterior que diz que o "politicamente correto" é ruim e por isso, qualquer coisa que o desafie estaria certo, mas está?

Não estou, ainda, propondo nenhum nível de sofisticação intelectual, nem a necessidade de tratar profundamente as ciências humanas, sociais e antropológicas. As afirmações propostas pelo "politicamente incorreto" de nossos tempos age como uma visão distorcida da realidade, algo que poderia ser chamado de ferramenta ideológica que é utilizada por uma classe de pessoas para defender ideias absurdas, que se valem de um contexto legitimador de uma violência sobre grupos que são compreendidos como minorias e que fizeram através da luta social histórica a oportunidade de legitimar a sua identidade.

Caso alguém ainda pergunte: o "politicamente correto" ataca a liberdade de expressão e de pensamento? Aquilo que estamos impedidos de dizer na esfera pública é uma ameaça a nossa liberdade? Definitivamente não! O "politicamente correto" é a única via para respeitar a liberdade conquistada através dos movimentos de reconhecimento de identidade realizados ao longo da história. "Minorias" conquistaram direitos, mulheres, negros, indígenas ou habitantes nativos, religiosidades, etc, foram todas construídas enfrentando uma rejeição, uma tentativa de aniquilação e ao conquistar espaços legítimos do funcionamento político da nação podem e devem fazer valer o fruto de sua conquista, ou seja, não é a privação de quem já estava inserido na política, é a incorporação de quem não estava. Não é privação de direitos para os que já estão atendidos pelos interesses sociais, é o reconhecimento de quem estava invisível. Quem questiona o "politicamente correto" está erroneamente acreditando que está perdendo espaço, quando na verdade está com seu consentimento pessoal ou por força social, permitindo igualdade entre os diferentes seguimentos que constituem a mesma sociedade.

O "politicamente correto", tal como se apresenta em nossos dias, permite a liberdade política, destaca e enfatiza as consequências e as responsabilidades de cada afirmação, de cada discurso. Tanto do ponto de vista epistêmico, quanto do ponto de vista de organização social e política, quem ataca o "politicamente correto" está lutando contra as transformações que foram fundadas e legitimadas através de ações históricas, que podemos conhecer, reconhecer e discutir sobre.

A liberdade de expressão, de pensamento e de conduta são amplamente defendidos pelo espaço do "politicamente correto", o que não cabe é a retórica perversa, saberes inconsistentes ou condutas preconceituosas que violentem agentes sociais reconhecidos. Não podemos privilegiar alguns em nome de outros. Ainda, o politicamente correto pode nos ajudar a perceber quem está sendo excluído, para que possamos colocá-los dentro de nossa sociedade, respeitando suas características identitárias.

Talvez, o "politicamente correto" seja a grande expressão de uma ideia verdadeiramente democrática, ou seja, somente polindo nossos discursos, compreendendo as lutas pelo reconhecimento das identidades das minorias, nós saímos de um regime unilateral, que atende alguns e oprime outros, transformando no trabalho coletivo, das diferenças, para construção da unidade nacional ou do reconhecimento internacional.

Não se trata de censurar o que se define como "politicamente incorreto", trata-se de compreender que ele deturpa a realidade, confunde e, por isso, estabelece sobrevida aquilo que já devia estar superado, ao que já não dá conta de compreender as demandas de nossa realidade.

Referências Bibliográficas:

Visitados em 19.01.2019



Quer saber mais sobre o assunto? Quer mais referências? Deixe nos comentários que assim que possível produzo outra publicação sobre o assunto.

Atenciosamente.
Prof. Ricardo Lopes

sexta-feira, 10 de abril de 2020

20 sugestões de leitura para enfrentar o novo coronavírus (Covid-19)

Saudações nobres leitores (as).

No dia 07.04.2020, realizei um encontro virtual ao vivo através do mecanismo Live do Instagram,onde procurei abrir um diálogo sobre qual ou quais os lugares das Ciências Humanas, Sociais e da Filosofia diante da pandemia oriunda do Covid-19.

Durante a transmissão algumas pessoas se mostraram interessadas em ler as referências que apresentei para embasar minhas falas e para atender o interesse destas pessoas resolvi escrever aqui uma lista com 20 referências para este momento de forma comentada.

Espero que este esforço seja útil para esclarecer as pessoas que se encontram em condição de isolamento ou de distanciamento social. Vamos juntos enfrentar as demandas vindas com este fenômeno de saúde pública e orgânica.

Caso você considere interessante ajude no compartilhamento das informações e,se possível,deste texto.

1. Organização Mundial da Saúde (OMS)


Parece-me que todos nós deveríamos em primeiro lugar buscar as informações oficiais de instituições que são responsáveis pelos mecanismos de saúde, por isso, minha primeira indicação é acessar o site oficial da Organização Mundial da Saúde. Infelizmente o site não tem a disponibilidade da língua portuguesa, portanto, estou deixando o link em língua espanhola, caso você prefira ler em outro idioma pode trocar na barra disponível logo na parte superior do site.

Neste site é possível encontrar as informações oficiais que a organização disponibiliza sobre o Coronavírus, situação dos países, como se prevenir, orientações para lidar com informações falsas, informações para quem necessita viajar e orientações técnicas para as equipes de saúde.

2. Organização Pan-americana de Saúde (OPS)


Neste portal é possível encontrar informações mais específicas de nossa região do globo. Aqui estão disponíveis os modos como os governos e as instituições de países pan-americanos estão lidando com a pandemia do Covid-19.

Estão disponíveis também materiais de divulgação de orientações sobre como lidar com a enfermidade e informações de prevenção. Estas orientações são muito úteis para fortalecer uma cultura de prevenção que visa minimizar a quantidade de pessoas infectadas, a meta primordial da instituição é o compromisso para evitar uma tragédia ainda maior, algo que choca em escala global.

3. Ministério da Saúde (Governo Federal do Brasil)


Para acompanhar as orientações, resoluções e as informações oficiais especificamente do Brasil o portal do Ministério da Saúde oferta logo em sua página inicial um caminho para todas as informações que a instituição julga pertinente, especialmente o suporte que o ministério tem ofertado para as localizações onde o coronavírus está atuando. Além disso, as informações oficiais de pessoas detectadas com o vírus e os óbitos são atualizados diariamente.

Como destaque gostaria de deixar explícito que é de suma importância acompanhar tal portal para compreender e cobrar os políticos (as) que estão diretamente envolvidos no enfrentamento desta condição que afetou o nosso país.

4. Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo


Para nós paulistas ou paulistanos é muito importante acompanhar os casos do vírus em nosso entorno. Para quem reside em outras localidades sugiro que procure as informações dos órgãos oficiais de seu Estado. É somente através destas orientações estaduais que é possível saber qual deve ser o nosso posicionamento diante do vírus, devemos ficar em distanciamento em isolamento? Ali você pode encontrar estas informações além de acompanhar os dados específicos de sua região.

Logo na página inicial o portal permite que você entre especificamente no que diz respeito ao vírus. Ali será possível saber em que "pé" anda a pesquisa e os encaminhamentos da pandemia.

Como destaque gostaria de deixar explícito que é de suma importância acompanhar tal portal para compreender e cobrar os políticos (as) que estão diretamente envolvidos no enfrentamento desta condição que afetou o nosso Estado.

5. Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo


Assim como a orientação dada sobre o órgão de Saúde do Estado de São Paulo, caso você seja de outro município, procure o portal responsável por disseminar as informações oficiais de sua cidade.

A importância de acompanhar as informações específicas da cidade é saber os limites do que podemos ou não fazer para manter a segurança individual e dos entes queridos (as).

Logo na página inicial você encontrará disponível o link que lhe jogará diante das informações específicas do Covid-19. Aqui na cidade de São Paulo a orientação é explícita: FIQUE EM CASA. Todas as pessoas que puderem ficar em casa devem fazer para ajudar no controle da infecção e no controle das pessoas que terão atendimento garantido nos leitos do Sistema de Saúde.

Como destaque gostaria de deixar explícito que é de suma importância acompanhar tal portal para compreender e cobrar os políticos (as) que estão diretamente envolvidos no enfrentamento desta condição que afetou o nossa cidade.

6. Portal de Periódicos da Capes


Caso você tenha interesse em buscar informações sobre como estão os estudos e o desenvolvimento das pesquisas científicas no Brasil e dos maiores portais de instituições internacionais a sugestão é acessar ao portal de periódicos da Capes. Ali estão disponíveis mais de 45 mil periódicos nacionais e internacionais sobre os mais variados assuntos estudados nas instituições de fomento a pesquisa científica.

Na página inicial existe, já, a indicação para quem busca informações sobre o novo coronavírus. As próximas três indicações são justamente extraídas dali.

7. ProQuest organiza e disponibiliza gratuitamente recursos de pesquisa sobre covid-19


Esta notícia disponível no portal de periódicos da Capes reúne os recursos que estão disponíveis gratuitamente para a pesquisa do Covid-19. O esforço da editora foi para reunir o máximo de informações possíveis para subsidiar pesquisadores (as) do mundo todo a criar possibilidades de enfrentamento da pandemia.

Essa ação de colaboração talvez seja uma das grandes iniciativas que o Covid-19 traz neste momento. Tendo nos afetado de modo tão rápido, todos nós precisamos buscar modos para lidar com esta realidade e caso possamos descobrir algo é preciso compartilhar rapidamente para preservar as vidas de milhares ou até milhões de pessoas.

8. Begell House destaca artigos pertinentes ao estudo do novo coronavírus


Assim como a referência anterior, esta notícia disponível no portal de periódicos da Capes reúne os recursos que estão disponíveis para a pesquisa do Covid-19. O esforço da editora foi para reunir o máximo de informações possíveis para subsidiar pesquisadores (as) do mundo todo a criar possibilidades de enfrentamento da pandemia.

Novamente: "Essa ação de colaboração talvez seja uma das grandes iniciativas que o Covid-19 traz neste momento. Tendo nos afetado de modo tão rápido, todos nós precisamos buscar modos para lidar com esta realidade e caso possamos descobrir algo é preciso compartilhar rapidamente para preservar as vidas de milhares ou até milhões de pessoas".

9. Cambridge oferece acesso a coleções de e-books para apoiar estudos durante pandemia


Esta notícia também está disponível no portal de periódicos da Capes, no entanto não vale exclusivamente para estudar o Covid-19. A Universidade de Cambridge oferece milhares de e-books para apoiar as instituições de ensino que se viram obrigadas a aderir ao distanciamento social. Para que todos possam ter recursos para continuar a sua trajetória de desenvolvimento intelectual, podemos contar com este acervo disponível neste momento de dificuldades para a manutenção de certos aspectos da "normalidade".

A indicação desta referência, mais do que para apoiar a pesquisa do Covid-19 pretende auxiliar num problema secundário da pandemia, não menos importante, a questão do isolamento e distanciamento que forçou as pessoas a lidar com um tempo recluso que não existia. Por isso, tão importante quanto cuidar dos aspectos da saúde pública trazidos pelo vírus é lidar com o modo como as pessoas estão lidando com esta transformação significativas na"normalidade" da vida.

10. Melhorar a gestão da saúde não basta


Este e as próximas 8 sugestões de leitura pertencem ao período da Revista Pesquisa da FAPESP, este portal é um dos principais mecanismos de divulgação da produção científica do Estado de São Paulo.

Especificamente sobre este artigo, o estudo demonstra as alternativas possíveis ou os cenários para evitar um colapso no sistema de saúde. Ali está a necessidade de ampliação dos leitos para tratar as pessoas que contraírem o Coronavírus.

11. A importância de testar em larga escala


Neste artigo existe a tentativa de demonstração de que o melhor modo para lidar com a crise trazida pela propagação do Coronavírus é a capacidade de realizar testes em larga escala, um dos desafios mais importantes que as instituições de saúde do mundo inteiro vêm enfrentando. Os testes possibilitarão o controle dos avanços do vírus e criar alternativas de enfrentamento da doença.

12. Isolamento social reduz taxa de transmissão do coronavírus na Grande São Paulo


Neste artigo existe as evidências que permitem associar o isolamento social com a redução da transmissão do Coronavírus e como isso pode ter evitado milhares de contaminação em São Paulo e evitado mortes.

13. Solidariedade na ciência


Neste artigo é revelada a estrutura colaborativa entre os pesquisadores (as) para criar ao máximo possível de ações para o enfrentamento da pandemia e de alicerçar caminhos para o desenvolvimento de pesquisas que podem ser promissoras para preservar o máximo possível as vidas da população.

14. Epidemia de fake news


Neste artigo é tratada a problemática das notícias e de falsas orientações para o enfrentamento da Covid-19, o que levou a OMS a declarar uma secunda pandemia, a de"fakenews". É comum existir divergência dentro de aspectos que ainda estão em processo de estudo, no entanto, o que temos visto nos últimos tempos é uma negação do que toda a comunidade internacional tem produzido e por isso é necessário realizar um esforço para restringir a circulação de notícias falsas. Tem gente usando a pandemia para obter retornos financeiros, políticos ou morais e isto deve ser combatido em nome da segurança da saúde de milhares ou milhões de pessoas.

15. Uma barreira física contra o coronavírus


Neste artigo podemos encontrar as conclusões do estudo chinês da eficiência das máscaras cirúrgicas para ser uma barreira física contra o vírus do Covid-19.  Embora não seja conclusiva, a informação é extremamente útil para o que diz respeito a possibilidades de evitar a propagação do vírus nas comunidades, pensando em possibilidades para romper com o isolamento social ou o distanciamento. Apenas fiquem alertas que a máscara não resolve os problemas, é apenas uma das alternativas para enfrentar a propagação do vírus, aguarde as orientações dos órgãos competentes antes de voltar a "normalidade".

16. Os danos do coronavírus


Neste artigo é possível encontrar os resultados das autopsias realizadas na USP. Ou seja, aqui é possível compreender os impactos do vírus no organismo das pessoas que contraíram o Covid-19 e chegaram ao resultado menos esperado por nós, o óbito. Assim podemos compreender o perigo da doença em nós.

17. O avanço do coronavírus no Brasil


Neste arquivo, que pode ser ouvido na forma de podcast, encontramos os estudos de modelos matemáticos que lidam com as possibilidades de avanço do vírus no Brasil. Em suma, o pesquisador tenta revelar os métodos que estão sendo utilizados para conseguir lidar com a demanda oriunda da pandemia e lê as informações que podemos inferir sobre o vírus em nosso país.

18. Desafios do isolamento


Outra de nossas preocupações deve ser nos impactos secundários que a pandemia pode causar em âmbito social. Sendo assim, é preciso que todos nós nos coloquemos diante das problemáticas que podem estar associadas ao isolamento social, a nossa saúde mental deve ser preservada e é um desafio uma vez que nos colocamos diante de uma ruptura abrupta com a "normalidade".

19. Portais de notícias do jornalismo tradicional

Link: [Use o mecanismo que você considera relevante]

Os conglomerados de comunicação, tv, rádio, jornal, embora possam ser alvos de inúmeras críticas, algumas pertinentes e outras duvidosas, são um mecanismo que apesar de tudo dependem de suas reputações e, por isso, neste momento de crise precisam estar alinhados com as necessidades sociais e com as demandas oficiais, o que pode ofertar uma certa segurança nas informações. Mas, veja bem, não estou sugerindo ver nenhuma mídia sem o seu crivo, cabe a você toda a responsabilidade de filtrar e considerar as problemáticas de cada informação consumida.

Como os portais são ferramentas que visam consumo, os meios de comunicação veiculam aquilo que a maior parte das pessoas querem consumir. Isto não as torna irrelevantes, apenas é preciso ter atenção com o que estamos consumindo.

20. Fontes alternativas

Link: [Use o mecanismo que você considera relevante]

Da mesma forma que os conglomerados de comunicação, boa parte das referências alternativas das notícias que consumimos, procuram produzir conteúdo que seja consumido. Tome cuidado, mesmo envolto de boa vontade, de suposta intensão de dizer o que ninguém quer dizer, estes meios normalmente se propagam de modo irresponsável, ou seja, estes veículos não se responsabilizam pelas informações prestadas, ou logo saem do ar e entram em nosso universo com novos nomes. Neste momento propagar informações falsas geram ainda mais pânico diante de um contexto já difícil, por isso, seja consciente.



Por fim:

Aqui busquei disponibilizar um material que parece útil para ter uma dimensão da complexidade que estamos enfrentando com o coronavírus e o Covid-19. Poderia, ainda, elencar mais muitas referências, no entanto, para não cansar você, nobre leitor (a), procurei elencar aquilo que julgo fundamental para todas as pessoas.

Quer saber mais sobre o assunto? Quer mais referências? Deixe nos comentários que assim que possível produzo outra publicação sobre o assunto.

Atenciosamente.
Prof. Ricardo Lopes

sexta-feira, 24 de maio de 2019

Relatório da Ação Formativa realizada pela Professora Regina em ATPC de Área (Parte 1)


Uma das ações que nós professores (as) de Ciências Humanas previmos no início deste ciclo de 2019 era estudar e procurar referências para aperfeiçoar o nosso trabalho em sala de aula.

A Professora Regina (História) disponibilizou para a área um estudo que realizou durante os primeiros meses do ano e que foi de grande valia para nossas discussões e para reavaliar as nossas práticas pedagógicas.

Em ocasião de realização da Reunião de Área da E.E. Alberto Torres a professora pôde apresentar os seus estudos e o relatório que publicamos aqui é fruto da exposição oral e de algumas reflexões propostas pelos docentes na oportunidade.

Esperamos que este estudo possa ajudar outros profissionais a pensar a disciplina ou a indisciplina em sala de aula, pensando sob a perspectiva da preservação do direito de aprendizagem e da nossa responsabilidade pelo ensino.

Data: 02.05.2019


A professora Regina ministrou na presente data uma ação formativa sobre a temática “relação em sala de aula: disciplina e indisciplina para pensar a influência do ensino-aprendizagem”.


A professora relatou que graças a um curso de formação contínua proposta na Universidade de São Paulo, organizada pela Associação dos Professores do Estado de São Paulo, teve contato com a obra de Júlio Groppa Aquino, psicólogo, mestre e doutor em Psicologia Escolar pela USP. Sendo assim, ela expôs as suas ideias e estarão descritas abaixo.

A indisciplina tem se tornado um obstáculo pedagógico, isto é, parece ter se tornado um decisivo fator que tem impedido o desenvolvimento de ensino e aprendizagem. Segundo Groppa é preciso refletir sobre a questão. O que nós entendemos por disciplina em sala de aula?

É preciso considerar que o que consideramos disciplina é na verdade um modo de comportamento que pode ser chamado de tradicional, aquele que está no paradigma da escola tradicional. Espera-se que os alunos (as) sejam disciplinados, discretos, receptivos as informações disponibilizadas pelo docente. Uma conduta rígida que supostamente rende aprendizagem porque o aluno (a) se submete a autoridade do professor (a).

Esperando a disciplina tradicional constatamos nas escolas o chamado “aluno problema”, isto é, aquele que foge dos padrões de comportamento esperados pela lógica tradicional. Groppa caracteriza os alunos problema em: o aluno que não respeita; o aluno que não tem limites; o aluno que não tem os requisitos para a aula.

Sabendo que estes paradigmas de alunos problemas existem é preciso investigar as suas causas. Talvez um primeiro indicador possa ser o questionamento realizado pela sociedade sobre a escola. Compreendendo que a sociedade questiona a legitimidade da escola, a sua importância para a formação do sujeito, é uma consequência a indisciplina. Se os valores dados a escola são frágeis, ou problematizados, os alunos (as) que as frequentam trazem consigo estes questionamentos e estas problematizações.

Para tentar solucionar este problema talvez seja interessante responder de modo consistente a questão: “escola, para quê?” Enquanto não houver uma resposta consistente e evidente as indisciplinas se manterão como problema no cotidiano escolar. A incerteza da finalidade da escola é que impossibilita a viabilização de métodos que façam o cotidiano aperfeiçoar-se de modo contínuo e superar aquilo que chamamos de indisciplina.

Além disso, caso estejamos engajados na solução da indisciplina é preciso considerar fazer uma contextualização precisa, atribuir sentidos, para a realização do cotidiano escolar, proporcionando ao estudante a valorização do ambiente e das ações nele desenvolvidas.

Para conseguir está contextualização é preciso pensar em respostas consistentes para as três seguintes indagações: 1. O que é a escola? 2. Como é a escola? 3. Para quê é a escola?                

Talvez um método pedagógico que consiga reunir as respostas seja o Contrato Pedagógico, é nele que o professor (a) pode deixar nítido o seu entendimento e as justificativas para fazer o que faz. O aluno (a) que compreende o contrato não pode descumprir, pode, sim, problematizar, mas em vez do conflito constrói-se situações de dialogicidade, de negociação e de ação educativa para valorar ainda mais o ambiente da escola.                                                                                                             


Relatório produzido por Ricardo Lopes

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Att.
Prof. Ricardo Lopes

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Uma síntese introdutória da Filosofia com base na pensadora Marilena Chaui

O que é a Filosofia?
É muito difícil responder o que é a filosofia de modo objetivo. Ao longo da história do pensamento diversas manifestações intelectuais receberam este nome. Para tentar esclarecer de modo introdutório vamos utilizar o ideário proposto por uma das maiores filósofas brasileiras, a Professora Marilena Chaui (1941-).

De modo geral “podemos dizer que a filosofia se constitui quando os seres humanos começam a exigir provas e justificações racionais que validem ou invalidem as crenças cotidianas” (CHAUI, 2014, p.18).

A produção do pensamento filosófico exige o esforço racional para validar ou invalidar as ideias que possuímos e, para isso, é necessário argumentar, isto é, construir um raciocínio que seja elucidativo. É preciso debater, isto é, confrontar argumentos para que sejam verificadas suas validades, consistências e inconsistências.

Ao argumentar e debater compreendemos de modo mais consistente e profundo as ideias que temos sobre as coisas do cotidiano, as coisas do mundo e de nós mesmos.

De certo modo podemos afirmar que o filosofar é uma espécie de atitude crítica. “Crítica provém do grego e tem três sentidos principais: ‘capacidade para julgar, discernir e decidir corretamente’; ‘exame racional, sem preconceito e sem prejulgamento de todas as coisas’; ‘atividade de examinar e avaliar detalhadamente uma ideia, um valor, um costume, um comportamento, uma obra artística ou científica’” (CHAUI, 2014, p.19).

Podemos caracterizar esta atitude crítica, o filosofar, como a unidade de dois procedimentos intelectuais e práticos: um procedimento negativo e um procedimento positivo.

A característica positiva da atitude crítica consiste em negar, em dizer não, aos modos corriqueiros com os quais levamos a vida e a explicamos. É um não aos preconceitos, é um não aos prejuízos, é uma indagação, um questionamento e uma problematização daquilo que nos parece óbvio e natural. É, de certo modo, desconstruir as ideias que temos.

A característica positiva da atitude crítica consiste em buscar as respostas para as problematizações, para as interrogações e para as indagações que fizemos, é construir argumentação, é sistematizar compreensões para entender a totalidade que compõe o objeto que estamos investigando. É responder ao menos: “O que é?”; “Como é?”; e “Por que é?”.

Em suma, adentramos na atitude crítica que promove o filosofar quando negamos o modo como estamos habituados a entender o mundo, as coisas e nós mesmos. Então, iniciamos um esforço para construir ideias, racionais, que validem ou invalidem as nossas crenças com base na argumentação, no debate e na compreensão.
                                               
“Para a filosofia, não sabemos o que imaginávamos saber – ou como dizia Sócrates, começamos a buscar o conhecimento quando somos capazes de dizer ‘Só sei que nada sei’” (CHAUI, 2014, p.19).

Referência bibliográfica: CHAUI, Marilena. Iniciação à Filosofia. São Paulo: Ática, 2014
Texto produzido pelo Professor Ricardo Lopes (Professor de Filosofia)
Este material foi produzido com finalidade pedagógica para os alunos (as) da primeira série do Ensino Médio.

domingo, 11 de novembro de 2018

Democracia: Das origens históricas (Parte I)

Para início de conversa...

Grande parte do globo terrestre vive, hoje, sob o regime político de Estado-Nacional de cunho democrático.

Muito embora devesse ser de conhecimento amplo o que significa viver em um Estado democrático, nós, contemporâneos, temos muitas dificuldades em assimilar as características que regem o bom desenvolvimento deste modelo paradigmático de vivência política.

Em especial aqui, no Brasil, vivemos constantemente crises de instituições democráticas. Aparentemente temos grandes dificuldades em estabelecer ordem seguindo os princípios da democracia. Esta dificuldade em fazer a manutenção social e do Estado segundo princípios democráticos dão a sensação de que estamos em ruína e somente um regime de força pode estabelecer a ordem e a manutenção das instituições. Mas, as coisas são realmente assim? Democracias verdadeiras podem dar certo?

Para pensar sobre as questões relativas a vivência em Estados democráticos proponho algumas reflexões introdutórias utilizando como referência a primeira manifestação deste regime na História conhecida. Vamos rememorar os princípios democráticos gregos para entender virtudes e falhas do nosso modo de lidar com a democracia.

Neste momento vamos nos deter em uma fonte básica primária, para que em momentos subsequentes possamos ampliar nossas investigações sobre as origens históricas da democracia.

Uma fonte básica primária: A democracia de Renato Janine Ribeiro.

Para iniciar nossa reflexão gostaria de sugerir um pequeno livro publicado pela Publifolha da coleção "Folha Explica" (ver referência bibliográfica no final deste texto), chamado A democracia. Escrito pelo Professor Renato Janine Ribeiro, professor titular de Ética e Filosofia Política da Universidade de São Paulo (USP), utiliza uma linguagem acessível e simples para que todos possam ter algumas referências para compreender as democracias.


Neste momento nos interessa particularmente o primeiro capítulo da obra intitulado "1. A DEMOCRACIA DIRETA", onde o Professor dedicará um esforço para explicar as origens conhecidas dos regimes democráticos, especialmente em algumas cidades-Estado da Grécia Antiga.

"A palavra democracia vem do grego (demos, povo; kratos, poder) e significa poder do povo. Pode estar no governo uma só pessoa, ou um grupo, e ainda tratar-se de uma democracia - desde que o poder, em última análise, seja do povo. O fundamental é que o povo escolha o indivíduo ou o grupo que governa, e que controle como ele governa" (RIBEIRO, 2013, p.8).

A própria etimologia da palavra democracia já revela traços importantes de seu fundamento e de sua estrutura de funcionamento. Em primeiro lugar, como deixa explícito o Professor, a democracia não é um simples modelo de funcionamento da máquina estatal, mas sim o fundamento legítimo de tal funcionamento. A democracia é o procedimento político que centraliza o poder na categoria chamada povo. Quem governa, isto é, quem é responsável pela manutenção da máquina estatal deve se submeter ao poder do povo.

O protagonismo numa democracia deve ser o poder do povo, isto faz com que os instrumentos que permitem a execução da vida política, dentre eles o Estado, sejam um meio para a realização deste poder. Desta perspectiva deve ficar evidente que a democracia não é estritamente política, mas também ética, no sentido de que representa muito mais do que os interesses de funcionamento da cidade, mas também, representa os valores e as aspirações da vida do povo. Dito de outro modo, a democracia não é apenas um regime de ordenação da vida social, é essencialmente a vida realizada do povo, por isso uma concepção ética e política.

Para tentar ilustrar o funcionamento desta concepção ético-política vale entender em linhas gerais como procederam na antiguidade grega.

O maior exemplo que dispomos de realização da democracia que é sabida até no senso comum é o caso da Atenas do século V a.C.. Embora quase sempre digamos que a democracia surgiu na Grécia Antiga é preciso esclarecer que não existia uma Grécia Antiga, o que nós chamamos de Grécia eram na verdade um conjunto de cidades-Estado independentes (as chamadas polis), isto é, cada cidade possuía um funcionamento político independente das cidades vizinhas. O que chamamos de Grécia é na verdade uma certa unidade linguística e cultural, mas não política.

De modo geral, inicialmente as cidades gregas eram governadas por sistemas de reinados, tal como se pode observar nas descrições das cidades realizadas pelas grandes obras literárias-históricas da época, como presente nas obras de Homero. A grande mudança ocorrida foi:

"O poder, que ficava dentro dos palácios, oculto aos súditos, passa à praça pública, vai para tó mésson, "o meio", o centro da aglomeração urbana. Adquire transparência, visibilidade. Assim começa a democracia: o poder de misterioso, se torna público, como mostra Vernant¹. Em Atenas se concentra esse novo modo de praticar - e pensar - o poder" (RIBEIRO, 2013, pp.8-9). [Para saber mais sobre Jean-Piere Vernant: https://www.independent.co.uk/news/obituaries/jean-pierre-vernant-431606.html]


Ainda de modo geral podemos dizer que para o conjunto de cidades-Estado possuíam três formas de regimes políticos vigentes, as monarquias, as aristocracias e as democracias. As diferenças entre cada regime político consistiam no número de pessoas exercendo o poder na cidade. Como a própria etimologia já explicita, na monarquia uma só pessoa detém o poder (mono=um). Na aristocracia o poder era centralizado na mão dos melhores (aristoi=excelentes). Na democracia se fundava um regime de legitimação de igualdade, isto é, o poder era exercido pelo "povo comum", não eram os feitos especiais que determinavam maior capacidade para exercer o poder, nem nenhum outro critério, tal como hereditariedade, sabedoria, etc.

É neste princípio de igualdade entre os que exercem o poder que reside a especialidade do regime democrático. As origens desta igualdade reside no deslocamento do poder do palácio para a praça, a ágora. O termo ágora significa "praça de decisões"

Nas cidades democráticas da Grécia a praça possui especial valor, porque é nela que o povo exerce a sua liberdade, fato que eles consideravam distintivo de outros povos, povos chamados de bárbaros. O modo de manifestar a liberdade era exercer o poder diretamente, por isso, na lei ateniense, por exemplo, quarenta reuniões ordinárias eram previstas em lei (no século IV a.C.), o que equivale a uma assembleia participativa a cada nove dias, fora a possibilidade de chamar por assembleias extraordinárias, que elevariam ainda mais a possibilidade de exercer o poder (RIBEIRO, 2013, p.9).

Nas assembleias constantes, os gregos, especialmente os democráticos, chamavam o povo para discutir, deliberar e decidir as questões que interessavam a todos. Na reunião que contava com algumas milhares de pessoas eram determinados através da participação direta os rumos da cidade.

Vale o adendo de que os que poderiam participar do exercício do poder na praça de decisões eram os cidadãos e esta categoria representava o conjunto de homens livres da cidade, deixando de lado uma parte considerável, os chamados não livres, da participação do exercício do poder. Sendo a igualdade o grande recurso para consolidar o exercício do poder, os requisitos para exercê-lo era a identificação com a liberdade, por isso, escravos, estrangeiros, mulheres e menores de idade não podiam participar da democracia ateniense.

O princípio da igualdade entre os cidadãos era tão presente que na democracia antiga quase não se elegia representantes, não haviam ou quase não haviam cargos fixos que permitissem a eleição de alguém que ficaria responsável pelos encargos. A regra era que as decisões deviam ser tomadas em assembleias e para aplica-la se incumbia um grupo de pessoas, mas estas pessoas não seriam eleitas e sim sorteadas.

A justificativa do sorteio é simples, nas palavras do Professor:

"Por quê? A explicação é simples. A eleição cria distinções. Se escolho, pelo voto, quem vai ocupar um cargo permanente - ou exercer um encargo temporário -,  minha escolha se pauta pela qualidade. Procuro eleger quem acho melhor. Mas o lugar do melhor é na aristocracia! A democracia é um regime de iguais. Portanto, todos podem exercer qualquer função" (RIBEIRO, 2013, pp.10-11).

Em suma, como o princípio básico para a consolidação da democracia é a igualdade entre todos que compõe a categoria povo, por que eleger alguns melhores do que outros para algo? O que os gregos democráticos compreenderam é que se todos os cidadãos são iguais e o modo pelo qual manter a igualdade é que todos podem exercer qualquer função, todos são aptos a desenvolver igualmente as decisões estipuladas em assembleia.

A exceção à regra, isto é, as escolhas que não eram feitas através de sorteio, estavam entre os cargos de chefes militares e alguns poucos outros cargos, porque ali se exigiam um certo saber técnico para proceder no cotidiano. Mas, os cargos que fugiam a regra ainda seriam submetidos ao poder do povo.

O exemplo mais usual na filosofia que pode ilustrar o funcionamento dos sorteios que determinam encargos temporários para realizar a manutenção da vida política é a formação de corpo de jurados, como nas palavras do Professor:

"Um exemplo é o júri. A frequência à ágora é grande, chegando a alguns milhares, numa Atenas que tem de 30 mil a 40 mil cidadãos. Mas os principais julgamentos são atribuídos a um tribunal especial, cujos membros são sorteados, o que hoje chamamos de júri. Temos um caso célebre, histórico: o julgamento de Sócrates. O filósofo é julgado, em 399 a.C., por 501 pessoas. Como 281 o condenam e 220 votam pela absolvição, ele é sentenciado à morte (RIBEIRO, 2013, p.11).

Podemos perceber que o funcionamento desta democracia é pautado pelas demandas que surgem na vida da cidade, como uma espécie da participação nos acontecimentos e nas decisões que julgam importantes para a vida livre.

Dentre os assuntos que eram discutidos na ágora, na praça das decisões, temos que lembrar que na época não existiam as complexidades sistêmicas que possuem as nossas formas de vida contemporânea. Basicamente o que era discutido na ágora era: a guerra e a paz, os assuntos do funcionamento da cidade, mas, como destaca do Professor Ribeiro, uma parte razoável das discussões parece girar em torno da religião e das festas religiosas.

Dito de outro modo, os encontros ordinários possuíam a finalidade de discutir festas religiosas e dividir as tarefas para a manutenção da cidade. Imagine que na antiguidade a complexidade das relações e das condições de existência possuíam uma forma muito menor que as nossas.

Por fim, é claro que a democracia antiga foi questionada e a primeira crítica foi elabora pelo filósofo antigo Platão, onde ele percebe alguns problemas que julga decisivos neste modelo de vida, levando em consideração alguns aspectos da justiça exercida na Atenas sobre o regime democrático. Mas, é evidente que todos que conhecem o funcionamento das democracias da antiguidade suspiram pela beleza de seu funcionamento, a participação na cidade era direta, era cheia de significado para o cidadão, uma vez que cada cidadão realiza a si na cidade e a cidade é o espaço para permitir ao cidadão a construção de algo maior do que si.

Neste breve texto foram apresentadas algumas referências preliminares para entender as origens da democracia. Em outras ocasiões vamos ampliar os conhecimentos, mas vale essa introdução. O grande fato que gostaria de destacar é que na antiguidade a consolidação da democracia permitiu a ação direta na execução e na manutenção da vida coletiva, da vida política, como expressão da vida ética.

Como destaque derradeiro, esta obra de referência, assim como este texto produzido tendo ele por base, tentam esclarecer para um público geral alguns aspectos conceituais básicos para a compreensão da democracia. A partir dos próximos textos vamos aprofundar referências acadêmicas e detalhar melhor as nuances e as especificidades das origens democráticas na antiguidade grega.

Referência Bibliográfica:

- RIBEIRO, Renato Janine. A democracia. São Paulo: PubliFolha, 2013 - (Coleção Folha Explica).



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Att.
Prof. Ricardo Lopes

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