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sexta-feira, 25 de outubro de 2024

"Quando tudo for privado, seremos privados de tudo": Uma crítica à privatização do bem e do serviço público


Saudações fraternas.

A privatização dos chamados bens e serviços públicos é um tema que permeia discussões econômicas, sociais e políticas ao redor de todo o mundo, revela-se uma questão complexa e multifacetada, mas que exige nosso empenho e atuação cidadã - especialmente porquê envolvem questões da realidade imediata, do acesso ou restrição à determinadas condições e acerca do futuro de quem acessará ou não estas determinadas condições.

À medida em que governos buscam soluções para problemas financeiros de caixa, disputas ideológicas ocorrem no seio da sociedade civil e supostamente todos tentam melhorar a eficiência dos serviços que chegam a cada cidadão ou consumidor - mesmo sabendo a problemática de utilizar o termo cidadão e consumidor lado a lado aqui, parece-nos necessário para o efeito do sentido da reflexão proposta -, a venda de ativos públicos, que podem ser bens ou serviços, torna-se uma alternativa atrativa para um setor da sociedade e um objeto de luta por outro. 

Essa estratégia, vender os chamados ativos públicos, pode gerar consequências profundas sobre a sociedade. A frase "quando tudo for privado, seremos privados de tudo" encapsula a essência de uma crítica que se intensifica à medida que a privatização avança, levantando questionamentos sobre a natureza do acesso e do direito aos bens essenciais - especialmente em condições onde o neoliberalismo vigora.

📌 O que está em jogo na privatização?

A privatização, em essência, envolve a transferência de bens e serviços do domínio público para a iniciativa privada. Mas, quem são os agentes físicos e jurídicos que são considerados membros da "iniciativa privada"? Quais os interesses que representam e qual o grau de responsabilidade que possuem para lidar com os bens e serviços de domínio público?

Essa proposta de mudança para a privatização, muitas vezes justificada pela promessa de maior eficiência e redução de custos, esconde uma realidade mais sombria. O acesso a serviços básicos, como saúde, educação e segurança, nos limites de todos os instrumentos existentes e os que ainda faltam, torna-se uma questão de capacidade financeira nos casos de privatização, em vez de um direito garantido a todos. Por exemplo, em países que adotaram políticas de privatização em larga escala, observou-se um aumento nas disparidades sociais. O setor privado, focado em lucro, tende a priorizar áreas que oferecem retorno financeiro, enquanto regiões marginalizadas podem ser deixadas de lado, criando um abismo entre classes sociais. Para demonstrar estes acontecimentos basta escolher o objeto público privatizado e fazer uma comparação sobre as mudanças provocadas pela desestatização - creio que você, estimado leitor e leitora, poderá fazer estas pesquisas e constatar com seus próprios critérios.

Ademais, a privatização pode resultar na deterioração da qualidade dos serviços prestados. Quando o objetivo principal é maximizar os lucros, o investimento em infraestrutura, a manutenção e capacitação de profissionais muitas vezes são negligenciados. Um exemplo claro é o setor de saúde. Em várias nações que implantaram sistemas de saúde privatizados, a dificuldade de acesso a tratamentos essenciais se tornou uma realidade alarmante. As pessoas se veem forçadas a optar entre a saúde e a ruína financeira, algo que contraria a premissa de que a saúde deve ser um direito universal. E, ainda, isso pode ser vislumbrado em uma grande quantidade de setores, tais como a educação, a segurança pública, o saneamento básico, etc.

📌 Um olhar sobre o impacto social:

O impacto social da privatização não se limita apenas à qualidade dos serviços, mas também se estende à coesão social, ou seja, a quantidade e coesão da unidade social. Quando os bens públicos são privatizados, a sensação de pertencimento e responsabilidade coletiva diminui. A comunidade, antes unida em torno de um bem comum, se fragmenta em interesses individuais e concorrentes, convertendo sem critérios críticos a cidadania em relações de consumo, o cidadão em consumidor. Essa transformação pode levar ao aumento da desconfiança entre os cidadãos e à erosão do capital social, essencial para a construção de uma sociedade saudável e funcional. Um estudo realizado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) destacou que sociedades com maior coesão social apresentam melhores índices de felicidade e desenvolvimento humano.

Além disso, a privatização pode criar um ciclo vicioso de dependência econômica. Com serviços essenciais dominados por empresas privadas, o governo se vê na posição de regular práticas que muitas vezes favorecem o lucro em detrimento do bem-estar social, ou, ainda, coloca os governos como pagadores das expectativas de lucros como se fossem gastos de manutenção do serviço, uma anomalia que é subsidiar com o dinheiro do Estado os serviços, transferindo diretamente dinheiro público para o privado sob a justificativa de manutenção do interesse social (cobrir quem não pagaria as taxas propostas pelo privado), mas que faz pelo valor imposto pela empresa que envolve a sua meta e expectativa de lucro e não o custo real do serviço ou bem. Um exemplo clássico é a privatização do sistema de água em várias cidades ao redor do mundo. Em muitos casos, as tarifas aumentaram drasticamente, levando comunidades a lutarem por acesso a um recurso que deveria ser universal. A luta por água potável se torna um reflexo da luta por dignidade, evidenciando como a privatização pode transformar um bem essencial em um produto de luxo.

📌 Alternativas à privatização: Enfoque na gestão pública eficiente.

Diante dos desafios impostos pela privatização, surge a necessidade de repensar o papel do Estado na gestão de bens e serviços públicos. A eficácia da gestão pública pode, de fato, proporcionar soluções viáveis sem a necessidade de transferir ativos essenciais para a iniciativa privada. Diversos estudos apontam que modelos de gestão colaborativa e participativa podem resultar em serviços de qualidade superior, com um foco maior nas necessidades da população. A experiência de países que mantém um forte controle estatal sobre recursos naturais, demonstra que é possível conciliar eficiência e responsabilidade social.

Investir em transparência e participação democrática cidadã na gestão pública é fundamental para restaurar a confiança da população. Quando os cidadãos se sentem parte do processo decisório, o engajamento aumenta e, consequentemente, a qualidade dos serviços se eleva. Programas de participação cidadã na gestão de serviços públicos têm mostrado resultados positivos em diversas localidades, promovendo um novo paradigma onde a coletividade e a solidariedade são priorizadas.

📌 Um chamado à ação:

A privatização de bens públicos não é apenas uma questão econômica, mas um dilema ético e social que afeta profundamente a vida de milhões. A frase "quando tudo for privado, seremos privados de tudo" serve como um alerta para a necessidade de repensar nossas prioridades enquanto sociedade. A busca por eficiência não deve se sobrepor ao direito fundamental de acesso a bens e serviços essenciais. É imperativo que se explorem alternativas que enfatizem a gestão pública eficiente, a transparência e a participação cidadã.

A luta por um futuro onde a dignidade humana e o acesso igualitário a recursos essenciais sejam garantidos é uma responsabilidade coletiva. Somente através da conscientização e da ação conjunta poderemos garantir que a privatização não se torne uma barreira ao desenvolvimento social, mas sim um passo em direção a uma sociedade mais justa e equitativa.

Deveras, os exemplos argumentativos deste texto se valem sumariamente de fatos perceptivos pelo senso comum e a vista dos noticiários tradicionais, no entanto, a investigação pode e assume escalas de pesquisa científica-acadêmica. Por se tratar de um primeiro texto deste autor sobre o tema, pareceu-me justo poder partir desta base menos rígida para demonstrar as ideias, os conceitos e os significados envolvidos. Em novas ocasiões o cunho especializado e metodológico serão incorporados - sempre mantendo a preocupação didática explicativa.

E você, pensa com seriedade o tema da privatização ou estatização dos bens e serviços públicos? Entende a necessidade e validade deste debate público e a importância do seu posicionamento neste movimento?

Caso tenha gostado, por gentileza, ajude este projeto. Compartilhe, comente e curta para fortalecer o nosso alcance e promover as melhores virtudes de nosso povo.

Até breve.
Respeitosamente.
Prof. Ricardo

Palavras-chave: Privatização; Gestão Pública; Serviço Público; Eficiência; Transparência; Interesse Social; bem público; ativo público.

domingo, 20 de outubro de 2024

A "Filosofia" nas palavras cantadas por Noel Rosa


Saudações fraternas. 

Noel Rosa (1910-1937), um dos maiores nomes da música brasileira, nos presenteou com um vasto repertório que transcende a música, demonstrando a sua relevância cultural e, cá entre nós, trazendo para a esfera popular temas sofisticados tal como a Filosofia. Suas canções, repletas de ironia e crítica social, convidam à reflexão sobre a condição humana. A música "Filosofia" é um excelente exemplo disso, abordando temas profundos de forma poética e acessível.


Nesta ocasião, gostaríamos de propor uma interpretação reflexiva de como o gênio de Noel Rosa pode instigar a reflexão pessoal, mas, também, instigar para um olhar voltado para a tradição filosófica.


Evidentemente, por se tratar de uma canção, talvez seja muito adequado começar a nossa reflexão ouvindo sua interpretação poética e conhecer detalhadamente a letra:


Filosofia

O mundo me condena e ninguém tem pena
Falando sempre mal do meu nome!
Deixando de saber
Se eu vou morrer de sede
Ou se vou morrer de fome?

Mas, a filosofia hoje me auxilia
A viver indiferente, assim!
Nesta prontidão, sem fim
Vou fingindo que sou rico
Pra ninguém zombar de mim!

Não me incomodo que você me diga
Que a sociedade é minha inimiga!
Pois, cantando neste mundo
Vivo escravo do meu samba
Muito embora, vagabundo!

Quanto a você da aristocracia
Que tem dinheiro mas
Não compra alegria!
Há de viver eternamente
Sendo escrava dessa gente
Que cultiva hipocrisia!

Compositores: Noel Rosa (1910-1937) e André Filho (1906-1974)


📌 Uma Desconstrução:


Em "Filosofia", Noel Rosa nos convida a uma reflexão sobre a vida, a sociedade e o indivíduo. A letra, aparentemente simples, revela uma complexidade que nos leva a questionar nossas próprias escolhas e a forma como nos relacionamos com o mundo.


A letra da música coloca em evidência o conflito entre o desejo de individualidade e as imposições sociais. Noel Rosa se questiona sobre a melhor forma de viver, se conformando às regras da sociedade ou seguindo seus próprios instintos. Podemos dizer que esta dualidade é uma questão filosófica na medida em que considerarmos se é possível ou não separar indivíduo e coletividade, ou em determinar os níveis que se manifestam tal relação, categorizando e racionalizando a vida à moda filosófica.


A busca incessante pela felicidade é outro tema central da canção. Noel Rosa ironiza a ideia de que a felicidade possa ser encontrada em bens materiais ou em uma vida de aparências. Ele sugere que a verdadeira felicidade está em encontrar um equilíbrio entre os desejos pessoais e as necessidades da alma. No fim das contas, embora exija-se socialmente a aparência da riqueza, Noel deixa explícito que o objeto da da verdade da vida não reside ali.


A letra da música também é uma crítica à hipocrisia e à superficialidade da sociedade. Noel Rosa denuncia a futilidade de muitas das nossas preocupações e a importância de cultivar valores mais profundos. Enquanto uma suposta aristocracia seria vista como portadora da felicidade aos olhos da sociedade, Noel reforça que quem detém tal alegria na verdade é aquele que se desvincula das hipocrisias e futilidades das normas sociais vigentes - e vale lembrar que Noel está criticando a sociedade brasileira da década de 1930, mais especificamente a sociedade carioca.


A música "Filosofia" nos mostra que a obra de Noel Rosa vai muito além do mero entretenimento - sim, já houve tempo em que a cultura estava além do entreter. Suas canções são verdadeiras lições de vida, que nos convidam a refletir sobre questões existenciais, dos modos pelos quais queremos e atuamos para conduzir a nossa vida, e, também, a construir uma sociedade mais justa e humana, talvez livre dos processos limitadores da liberdade de nossa existência que são ilustrados na superficialidade de uma "elite" cultural e social.


A canção "Filosofia" de Noel Rosa é um convite à reflexão sobre a condição humana e a busca por um sentido para a vida. Ao analisar a letra, podemos perceber que o compositor brasileiro antecipou muitas das questões que ainda hoje nos inquietam. Sua obra, portanto, continua relevante e atual, inspirando novas gerações a pensar de forma crítica e independente.


E você, o que achou da música? Como compreende a crítica proposta por Noel Rosa em sua clássica obra "Filosofia"? Ainda estamos vivendo de modo superficial e fútil? Ainda "fingimos ser ricos para ninguém zombar da gente"? Ou, já entendemos que a vida precisa ser fiel ao próprio sentido de nossa existência?


Espero que tenha gostado desta breve reflexão. Caso possa, ajude este projeto comentando, compartilhando e curtindo. Com o seu apoio poderemos levar o pensamento crítico e a tradição filosófica para mais pessoas.


Até breve.

Respeitosamente.

Prof. Ricardo


Palavras-chave: Filosofia; Noel Rosa; Música Popular Brasileira; Samba; Refletir a vida; Reflexão sobre a vida e sobre a sociedade.

segunda-feira, 2 de setembro de 2024

Relações Desumanas no Trabalho

 



Saudações. 


O ambiente de trabalho, que deveria ser um espaço de crescimento e desenvolvimento, ou no mínimo um lugar de busca por alguma harmonia social, muitas vezes se transforma em um campo minado de relações desumanas. A pressão por resultados, a competitividade exacerbada e a falta de empatia têm gerado um cenário cada vez mais desgastante para os profissionais.


Talvez seja demasiado esperançoso esperar do ambiente laboral possibilidades de crescimento e desenvolvimento, mas, sinceramente, talvez o nosso contexto pode ser chamado de cruel. As relações humanas básicas estão deterioradas. Um colega ou nós mesmos adoecemos, qual a reação dos que ficam no trabalho e dos "chefes"? Somos tratados com amizade, coleguismo e um mínimo de atenção, ou somos vistos como um problema, uma pessoa que atrapalha na ocasião? Quem se importa em saber como estamos nestes momentos? 


Muitas são as situações em que relações desumanas acontecem nos espaços profissionais de nossos tempos, para tentar elucidar a questão, gostaria de expor algumas condições degradantes que estamos sujeitados. Quem sabe buscando esclarecer não mudamos um pouco a nossa experiência? 


Sentir-se valorizado é fundamental para qualquer profissional. A ausência de reconhecimento pelo trabalho realizado pode gerar desmotivação e insatisfação. A falta de reconhecimento pode ser ilustrada de várias formas: quando o profissional é tratado como substituível de modo recorrente, quando o trabalho desempenhado é tratado como feito que qualquer um poderia fazer, ou, quando ausente todos se comportam como se tudo estivesse normal e a ausência fosse irrelevante. 


Atitudes como humilhação, críticas constantes e isolamento podem causar danos psicológicos e físicos aos trabalhadores. Estas situações são recorrentes nos ambientes profissionais, muito embora as justificativas não sejam sempre explícitas. Quando o ambiente produz um grupo que supostamente está "alinhado" e outro que não, o desgaste é inevitável. Obviamente, quando existe relações de poder envolvidas, as situações se tornam ainda mais cruéis.


A exigência de cumprir metas cada vez mais altas em prazos curtos pode levar ao estresse e à exaustão. O mito do máximo de trabalho com o mínimo de recursos, para otimizar gastos, leva aos que estão trabalhando no limite de uma vulnerabilidade única. Quando os resultados ou falhas acontecem, a aparência é que tal pessoa foi incompetente, quando, na verdade, a estrutura desgastou tanto que tornou inviável cumprir as expectativas. A frustração se torna pessoal, mas trata-se de uma falha coletiva. 


A comunicação explícita e eficaz é essencial para um bom relacionamento interpessoal. A falta dela pode gerar conflitos e mal-entendidos. Quando se pressupõe atuações e responsabilidades, sem a existência de combinados firmados, aqueles que se julgam afetados passam a realizar julgamentos injustos que humilham os que estão no objeto da crítica. 


As relações desumanas no trabalho não são apenas um problema individual, mas um problema social que precisa ser combatido. É fundamental que as instituições e empresas invistam em um ambiente de trabalho mais humano e saudável, onde todos se sintam valorizados e respeitados. E, nós trabalhadores (as) temos obrigação de fazer nossa parte e atuar sistematicamente em nome da humanidade nas relações laborais.


Comente abaixo e me diga o que achou deste texto! Contribuiu para pensar a respeito do tema?


#relaçõesdesumanas #trabalho #bemestar #saudemental #culturaorganizacional


Até breve.


domingo, 1 de setembro de 2024

 "Naquela Mesa": Uma experiência de memória e saudade


Saudações.


A canção "Naquela Mesa", imortalizada na voz de Nelson Gonçalves e de tantos intérpretes ilustres, transcende as notas musicais e se transforma em um verdadeiro retrato da alma humana através de uma poética única. Através de versos simples e carregados de emoção, a música nos convida a uma profunda reflexão sobre a importância da família, da memória e da inevitabilidade da perda.


Para que você possa sentir do que estou falando e dos motivos pelos quais escolhi esta música, gostaria de compartilhar algumas das versões que mais gosto e emocionam:







📌A mesa como símbolo:


A mesa, elemento central da canção, representa muito mais do que um simples móvel. Ela se torna um símbolo do lar, do aconchego e dos momentos compartilhados com os entes queridos. É ao redor da mesa que se reúnem as famílias, que se contam histórias e que se fortalecem os laços afetivos.


Quando pensamos na expressão "naquela mesa", o nosso imaginário faz uma ligação direta com nossas memórias, proporcionando imediatamente uma imagem mental para nós, imagem esta que nos leva as nossas próprias histórias de casa. Foi naquela mesa que recebemos os conselhos, que ouvimos as anedotas, que conversamos sobre os planos de família... em suma, a figura da mesa nos suscita memórias, lembranças e afetos.


📌A ausência e a saudade:


No entanto, a canção também nos confronta com a dor da ausência. A mesa, antes repleta de vida e alegria, torna-se um lugar de saudade e melancolia. A figura paterna, antes presente e acolhedora, agora está ausente, deixando um vazio imenso no coração de quem ficou.


É evidente que a música "pega" mais quem passou pela perda, mas, não é só sobre essa ligação pessoal que a música afeta. Na verdade, a canção proporciona uma dimensão de ancestralidade, de ligação com nossas raízes familiares, entendendo este termo menos como categoria e mais como laço afetivo.


No fim das contas, quem ficou, quem experiencia a vida, precisa lidar com o fenômeno da finitude e a tristeza não é dispensável, mas, ao contrário, é uma experiência fantástica da vida por nos colocar na dimensão precisa de lidar com a falta que nos faz os lugares vazios que outrora foram preenchidos por pessoas amadas.


📌A força da memória:


Mesmo diante da dor, a música nos mostra a força da memória. As lembranças dos momentos vividos ao redor daquela mesa são como um bálsamo para a alma, permitindo que a figura do pai continue viva no coração de quem o amou.


A memória é uma forma de existência real. Através da memória podemos superar a nossa limitação temporal do agora, fazendo do passado uma força do hoje. A música explora isso de forma magnânima, demonstrando o nosso potencial de honrar os nossos afetos e lembrar como nos tornamos estes de hoje.


📌Um legado atemporal:


"Naquela Mesa" é mais do que uma simples canção. É um hino à vida, à família e à memória. Suas palavras ecoam em nossos corações, nos lembrando da importância de valorizar os momentos presentes e de cultivar os laços afetivos.


Talvez nem todas as pessoas tenham a sorte deste tipo de vínculo trazido na canção, mas, inclusive para quem não teve, ergue-se a possibilidade de sentir este tipo de experiência. Por isso, talvez não seja exagero falar que a música possui um legado atemporal.


Naquela mesa é uma expressão poética do amor, da valorização da vida e da memória, expressão de nostalgia e saudade, mas, acima de tudo, é expressão da condição humana que está sujeita as tristezas e saudades oriundas de nossa finitude. 


📌Explorando a letra:


Nada que eu fale ou tente explicar pode substituir o contato direto com a poesia e a potência do próprio compositor. Por isso, para finalizar este texto gostaria de lhe proporcionar o contato direto com o que tentei expor.


Naquela mesa


Naquela mesa ele sentava sempre

E me dizia sempre o que é viver melhor

Naquela mesa ele contava histórias

Que hoje na memória eu guardo e sei de cor


Naquela mesa ele juntava gente

E contava contente o que fez de manhã

E nos seus olhos era tanto brilho

Que mais que seu filho

Eu fiquei seu fã


Eu não sabia que doía tanto

Uma mesa num canto, uma casa e um jardim

Se eu soubesse o quanto dói a vida

Essa dor tão doída não doía assim

Agora resta uma mesa na sala

E hoje ninguém mais fala do seu bandolim


Naquela mesa 'tá faltando ele

E a saudade dele 'tá doendo em mim

Naquela mesa 'tá faltando ele

E a saudade dele tá doendo em mim


Agora resta uma mesa na sala

E hoje ninguém mais fala do seu bandolim

Naquela mesa 'tá faltando ele

E a saudade dele 'tá doendo em mim

Naquela mesa 'tá faltando ele

E a saudade dele 'tá doendo em mim


Eu não sabia que doía tanto

Uma mesa num canto, uma casa e um jardim

Se eu soubesse o quanto dói a vida

Essa dor tão doída não doía assim

Agora resta uma mesa na sala

E hoje ninguém mais fala do seu bandolim


Naquela mesa 'tá faltando ele

E a saudade dele 'tá doendo em mim

Naquela mesa 'tá faltando ele

E a saudade dele 'tá doendo em mim



Fonte: LyricFind

Compositores: Sergio Bittencourt

Letra de Naquela mesa © Editora e Importadora Musical Fermata do Brasil Ltda.




#NaquelaMesa #NelsonGonçalves #MúsicaBrasileira #Saudade #Família #Memórias #Música #MPB #Canção #Choro #Emoção #AnáliseMusical #LetraDeMúsica #HistóriaDaMúsica #SérgioBittencourt #MúsicasParaRefletir #MúsicaComEmoção #MúsicaQueTocaOCoracao #LegadoMusical



E você, tem alguma lembrança especial relacionada a uma mesa e à família? Compartilhe nos comentários!



Até breve!



domingo, 14 de julho de 2024

"Tinha eu quatorze anos de idade": A crítica veemente e delicada de Paulinho da Viola e Elton Medeiros

Saudações estimados leitores e estimadas leitoras.

Hoje gostaria de dedicar algumas palavras sobre uma das músicas que mais gosto, que mais me sensibiliza e mais me provocou uma espécie de identificação com os compositores. A canção "14 Anos", composta por Paulinho da Viola e Elton Medeiros em 1968, narra a história de um jovem de 14 anos que se vê diante de uma escolha crucial: seguir os sonhos de se tornar um sambista ou atender às expectativas paternas de seguir uma carreira tradicional como médico, engenheiro ou filósofo. Através de uma letra poética e melodia melancólica, a canção explorou temas como conflitos geracionais, a busca pela identidade e a valorização da cultura popular brasileira mesmo diante do enfrentamento da indústria cultural que busca se apropriar das manifestações culturais genuínas, convertendo-as como meras e exclusivas mercadorias, objetos de consumo fugaz.

Talvez você estimado (a) leitor (a) já conheça a música, mas, para criar uma sequência de raciocínio que possa ser mais abrangente e este texto compreensível mesmo por quem ainda não conhece a canção, neste momento gostaria de sugerir dois movimentos. O primeiro consiste em permitir que cada um de vocês ouça a música:

(Desculpem caso não gostem desta versão, existem muitas outras disponíveis com fácil acesso, escolhi esta com base num critério muito pessoal).

Após a sua contemplação da canção, gostaria que você tivesse a oportunidade de ler com atenção e calma a letra genial de Paulinho da Viola e Elton Medeiros:


14 Anos

Tinha eu 14 anos de idade
Quando meu pai me chamou (quando meu pai me chamou)
Perguntou-me se eu queria
Estudar filosofia
Medicina ou engenharia
Tinha eu que ser doutor

Mas a minha aspiração
Era ter um violão
Para me tornar sambista
Ele então me aconselhou
Sambista não tem valor
Nesta terra de doutor
E seu doutor
O meu pai tinha razão

Vejo um samba ser vendido
E o sambista esquecido
O seu verdadeiro autor
Eu estou necessitado
Mas meu samba encabulado
Eu não vendo não senhor

(Extraído de: https://www.letras.mus.br/paulinho-da-viola/278680/ , visualizado em 14.07.2024)


"Creio que seja muito óbvia a condição que tanto emociona alguém que sonhou ser músico durante toda infância/juventude e escolheu a carreira em filosofia para a vida adulta, no caso este autor que lhes escreve. Mesmo sabendo que o prestígio pela carreira em filosofia tenha vertiginosamente caído em nossas terras, a canção ainda diz muito sobre o ideário de nosso povo. Talvez o único jeito que eu posso descrever pessoalmente como esta música me afeta é: "parece que escreveram para mim". Tenho certeza que cada um de vocês já sentiu isso com alguma música".


É evidente, para você estimado (a) leitor (a) não interessa saber das percepções pessoais que esta música provoca no autor deste texto. Vamos, a partir daqui, propor algum trabalho intelectual sobre a brilhante composição dos grandes ícones da cultura popular brasileira.

Em uma perspectiva de análise formal, a canção apresenta uma estrutura simples e repetitiva, estrutura esta que contribui para a fácil memorização da letra e reforça a mensagem central da canção. A melodia é melancólica e nostálgica, transmitindo a tristeza do jovem diante da difícil escolha que precisa fazer. O ritmo de samba, no entanto, traz um toque de esperança e resistência, sugerindo que o jovem não desistirá facilmente de seus sonhos. A harmonia é simples e direta, utilizando poucos acordes nas cordas e simplicidade rítmica. Essa simplicidade reforça a ideia de que a canção se concentra na emoção e na mensagem central, sem floreios desnecessários, enfatizando o dilema juvenil de enfrentamento das condições sociais que lhe são impostas.

Em busca de uma análise temática, por assim dizer, a canção retrata o conflito entre o jovem, que sonha em ser sambista, e seu pai, que deseja que ele siga uma carreira tradicional, que lhe traga maior prestígio social e lhe garanta um suposto sucesso pessoal representado pela aprovação pública. Esse conflito reflete as tensões sociais da época, em que a cultura popular brasileira era frequentemente desvalorizada pela elite supostamente erudita.

Ainda, podemos destacar a temática do jovem aos 14 anos que se encontra em um momento crucial de sua vida, buscando definir sua identidade e seu lugar no mundo. A escolha entre seguir seus sonhos ou atender às expectativas paternas representa essa busca por autoconhecimento, mas também revela a difícil fase que todos nós passamos em nosso crescimento que é ponderar até que ponto estamos dispostos a abrir mão de nós mesmos para produzir os resultados que esperam de nós.

A canção celebra, através da escolha do jovem em manter-se fiel à sua "vocação", a importância da cultura popular brasileira, representada pelo samba. Apesar da desvalorização por parte da elite da época, que talvez perdure até hoje, o jovem reconhece o valor do samba como forma de expressão cultural e identidade social. 

A música também apresenta uma crítica social sutil, ao abordar a exploração dos sambistas pela indústria fonográfica, criando a "obrigação" de se vender para sobreviver, revelando no momento histórico em que acontecia a conversão do que significava ser músico e especialmente sambista antes e depois da sua apropriação pela indústria cultural fonográfica. O jovem, personagem da canção ou sujeito lírico, observa que o samba é vendido, enquanto os sambistas são esquecidos e mal remunerados, ressaltando que embora se pagasse pelas composições havia o descaso com o "verdadeiro autor" e com o que significava verdadeiramente ser sambista.






"14 Anos" é uma canção tocante, especialmente quando nos afeta na dimensão da identificação, reflexiva que explora temas muito relevantes para a história recente de nosso país, tais como  os conflitos geracionais, a busca pela identidade e valorização da cultura popular em meio a uma sociedade que marginaliza e "rebaixa" a cultura de origem popular. Através de uma linguagem simples e direta, a canção nos convida a refletir sobre nossos próprios sonhos e aspirações, e a importância de lutarmos por aquilo que acreditamos.

E para você, como foi a transição da juventude para a vida adulta? Caso ainda esteja nesta transição, como está sendo? Se ainda não chegou nesta fase, o que espera passar?

Não tenho dúvidas que o contexto ilustrado por Paulinho e Medeiros já se transformou significativamente, no entanto, as questões base, as provocações e seus sentidos mais profundos são latentes de modo atemporal e universal, precisamente por isso, nesta ocasião, aproveito para escrever esta reflexão como forma de homenagem aos grandes mestres da cultura popular brasileira.

Espero que tenham gostado do texto. Caso possa, ajude este texto a circular compartilhando com os seus entes queridos (as) ou com os amigos (as).

Até breve.
Atenciosamente/Respeitosamente.
Prof. Ricardo de Jesus Lopes

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